O Curso

 

HISTÓRIA DO CURSO

Em 1991, naqueles tempos revoltos de governo Collor, as universidades públicas brasileiras viveram momentos delicados, pressionadas pelo MEC para ampliarem suas atividades, sem que isso significasse aumento de despesas. E a justificativa, segundo avaliação do então Ministro da Educação, Carlos Chiarelli, endossada presidente caçador de marajá era que havia uma enorme ociosidade em todas elas.

Atendendo a esta determinação governamental, cada IFE optou por uma estratégia para ampliar seu atendimento à sociedade.

No caso da UFV, a opção foi pela criação de novos cursos e os escolhidos foram: Direito e Arquitetura e Urbanismo.

À época, como chefe do Departamento de Engenharia Civil e, sendo arquiteto e urbanista, fui nomeado coordenador do processo de criação deste novo curso que ficaria vinculado a este departamento. Essa vinculação inicial moldou muito do caráter do curso a ser criado.

Ato contínuo, reuni com meus colegas do setor de desenho técnico deste departamento, onde era lotado, para definir as bases deste novo curso. É importante lembrar que havia neste setor somente dois arquitetos: eu e a Profa. Aline Werneck Barbosa de Carvalho, que também subscreve este texto, cuja participação foi fundamental para definirmos a primeira grade curricular. Nessa primeira proposta pedagógica, aproveitou-se o potencial de disciplinas existentes em cursos afins, na UFV, sobretudo na área de conhecimentos básicos e tecnológicos, e criaram-se as disciplinas específicas pertinentes à Arquitetura e Urbanismo, para as quais foram contratados novos professores. Posteriormente, essa grade curricular foi sendo revista e alterada para se ajustar às novas diretrizes curriculares do MEC.

Dadas as especificidades de um Curso de Arquitetura e Urbanismo, e por localizar-se numa cidade interiorana, decidiu-se que o novo curso deveria conter uma proposta diferenciada.

Decidimos que não iríamos montar um processo de criação de mais um curso de arquitetura e urbanismo mas, sim, de um curso que tivesse aderência com os demais da instituição, onde fosse possível, bem como um curso que respondesse as demandas da sociedade com um olhar mais amplo de atuação profissional.

Começamos então por uma pesquisa sobre os cursos existentes no país, particularmente, em Minas Gerais, onde constatamos existir, naquela época, apenas quatro, sendo três na capital e apenas um no interior, na UNIFENAS, em Alfenas. Dos quatro, apenas um em universidade pública. Todos formavam um profissional sem nenhuma diferenciação.

Com relação à localização destes profissionais em Minas Gerais, segundo informações obtidas no CREA/MG, dos quase três mil profissionais inscritos naquele conselho em 1991, cerca de dois mil seiscentos tinham seu endereço profissional na capital, ou seja, apenas 14% do total de arquitetos estavam trabalhando no interior do estado, o que significava: centenas de cidades mineiras sem a presença de pelo menos um profissional nesta área. Soma-se a estas constatações o fato de a UFV ser uma instituição localizada no interior, inserida, portanto, em uma realidade muito diferente de uma metrópole.

Com relação aos possíveis pontos de interseção com outros cursos da UFV, verificamos uma crescente demanda por projetos mais elaborados de instalações rurais, como estábulos, granjas, abatedouros, agroindústrias, dentre tantos outros que formavam um campo de trabalho ainda não percebido e muito menos ocupado pelos arquitetos, mesmo considerando a pertinência destes projetos com a nossa formação.

Considerando que este seria o primeiro curso de arquitetura em uma universidade pública em Minas Gerais, fora da capital, bem como a determinação de conceber um curso diferenciado, chegamos a uma proposta com três ênfases: planejamento de cidades de pequeno e médio porte, arquitetura rural e paisagismo.

Dessas, a ênfase em pequenas e médias cidades se fortaleceu e, de certa forma, tornou-se um diferencial do Curso de Arquitetura e Urbanismo de Viçosa, numa época em que o estudo de cidades desses portes demográficos ainda não era considerado relevante. A proposta pedagógica do curso ainda inovou em dois aspectos: mediante a exigência de viagens de estudos vinculadas às disciplinas de Projeto Arquitetônico, como forma de suprir as dificuldades decorrentes da localização geográfica numa cidade sem importantes exemplares da produção arquitetônico-urbanística nacional, e mediante a formulação de uma proposta de Trabalho Final de Graduação composta por duas etapas: um trabalho monográfico, de fundamentação, e o projeto arquitetônico-urbanístico.

No seu primeiro vestibular, realizado em 1992, tivemos 24 candidatos por vaga, e foi o terceiro curso mais concorrido da UFV naquele ano. No ano seguinte, lançamos o primeiro e, até hoje, único livro sobre Arquitetura Rural de autoria do professor Cuno Roberto Lussy, da EAUFMG. O indicativo de que estávamos no rumo certo confirmou-se por meio das subsequentes avaliações de desempenho no Exame Nacional de Cursos de Graduação do MEC, na época, chamado de Provão, onde obtivemos o conceito máximo (conceito A).

Curso aprovado, vestibular realizado e livro lançado era hora de enfrentar mais um grande desafio: a construção de um prédio próprio para funcionamento do Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU). Afinal, um curso de arquitetura sem o seu espaço é como um curso de medicina sem cadáveres.

A primeira tentativa nesta direção foi através de uma parceria com a USIMINAS que, naquela época procurava uma instituição disposta a formar profissionais que tivessem um maior domínio de edifícios em estrutura metálica. Manifestamos nosso interesse em criar mais esta ênfase e foi proposto que a empresa, em contrapartida, nos cedesse a estrutura metálica de nossa futura sede. Uma parceria interessante para as duas partes. Para a UFV, porque conseguiríamos viabilizar nosso prédio e, para a empresa, porque o próprio prédio serviria como um exemplo de como utilizar esta tecnologia.

Embora tenha havido total interesse por parte da empresa, chegando, inclusive, a elaborar uma minuta de convênio, essa negociação esbarrou na burocracia interna da instituição que não aprovou este convênio sob a alegação de que a universidade não poderia receber o que a empresa se propunha doar da forma como estava na minuta.

Mas, não desistimos e continuamos reivindicando nosso espaço.

Como alternativa a esta insistente solicitação, a universidade nos cedeu um prédio desativado, em péssimo estado de conservação, mas com um grande potencial para ser reformado e ampliado e uma equipe de obra do seu quadro. Não havia, entretanto, recursos para bancar os custos de grandes intervenções, somente pequenos reparos e pintura.

Fizemos todos os projetos necessários para a adequação deste prédio e, com eles debaixo do braço, fomos garimpar onde fosse possível, para conseguir algum recurso.

Foi quando descobrimos, através de um amigo que trabalhava no MEC, que havia recursos disponíveis no ministério para reforma de prédios. Enviamos os projetos e conseguimos aprovar uma parte do que seria necessário para esta obra. Isso foi fundamental para que ela pudesse finalmente iniciar, mesmo sabendo que não teríamos dinheiro para conclui-la, conforme gostaríamos.

O desafio agora era conseguir o que faltava, de modo a não ficar no meio do caminho.

Se, oficialmente, não havia nenhuma possibilidade de conseguir mais dinheiro, não me restava alternativa, senão bater na porta das empresas e pedir doações de materiais. Fizemos isso usando o seguinte argumento: se formamos os futuros especificadores de materiais, conhecer bem estes produtos seria interessante, tanto para quem os fabrica, como para quem os especifica.

Assim, considerando a recente e frustrada parceria com a USIMINAS, a alternativa foi propor algo mais simples, ou seja, fazer negociações menores, com várias empresas, sem que para tanto fosse necessário formalizar estas interações através de um convênio ou contrato. Sabia que havia riscos nesta decisão, mas não hesitamos em corrê-los. Tinha perfeita consciência de que, caso esta estratégia desse certo, os ganhos seriam estritamente institucionais, na medida em que a construção deste prédio era absolutamente necessário para que as atividades deste novo curso pudessem acontecer da forma mais satisfatória possível.

O UNIEMP, programa de parceria entre a universidade e as empresas, foi a forma encontrada para dar uma cara para estas negociações. Através dele, as empresas cederiam seus produtos e, em contrapartida, a universidade faria a divulgação dos mesmos entre os alunos e os profissionais da cidade, além de disponibilizar as instalações para realização de cursos, palestras e workshops sobre os materiais cedidos.

Era uma forma inovadora de a empresa divulgar seus produtos, ou seja, ao invés de nos enviar catálogos e mais catálogos, como de praxe naqueles tempos sem Internet, eles seriam aplicados no prédio. Agindo assim, garantiríamos a continuidade da obra, e a empresa teria a certeza de uma divulgação diferenciada e permanente do seu produto, não apenas expondo em pequenas amostras ou maquetes demonstrativas.

E foi assim que, depois de um ano e meio de obra, sem nenhuma interrupção por falta de recursos ou de materiais, o sonho de ter um prédio próprio realizou-se, com a inauguração de um edifício que causou um grande impacto no campus.

Este impacto foi causado, tanto pela rapidez de sua construção, como também pelos seus aspectos diferenciais, quer seja na sua composição estética, quer seja nos materiais utilizados, confirmando, dessa forma, que a interação universidade empresa é um caminho que nós, da academia, demoramos muito para conhecer.

Mais tarde, após o recredenciamento do curso, foi construído um edifício anexo ao prédio original, para abrigar os laboratórios de maquete, técnicas retrospectivas e conforto ambiental.

Outro importante impulso para o curso de Arquitetura e Urbanismo foi a celebração de um convênio com a TUNS – Technical University of Nova Scotia, atual Dalhousie University, no Canadá, logo nos primeiros anos de funcionamento do DAU. Por meio desse convênio foram aportados relevantes recursos financeiros para a consolidação do curso e realizadas importantes ações, a começar pelo treinamento de professores do DAU no Mestrado em Urban and Rural Plannig, em Halifax (Nova Scotia). Com base nessa experiência internacional, foi criado o curso de Especialização em Planejamento Municipal, dirigido a profissionais de várias áreas e técnicos de Prefeituras Municipais e de outros órgãos ligados ao planejamento urbano. Esse curso de especialização funcionou no período de 1996 a 2005 e constituiu-se o embrião do atual curso de mestrado em Arquitetura e Urbanismo do DAU. Por fim, por meio do convênio citado, constituiu-se uma biblioteca específica para o Curso de Arquitetura e Urbanismo, que funcionou no edifício do DAU até 2004, quando os livros foram doados para a Biblioteca Central da UFV.

Essas ações realizadas ao longo dos anos foram fundamentais para a consolidação do curso de Arquitetura e Urbanismo, que vem sendo construída ano a ano, pela dedicação e esforço conjunto da Administração Superior da UFV, dos diversos chefes de Departamento do DAU que se empenharam na construção e manutenção das instalações físicas, dos Coordenadores de Curso, atentos às necessidades pedagógicas, e dos professores e funcionários, que se dedicam diariamente para manter a excelência acadêmica que caracteriza os cursos da UFV.

Aline Werneck Barbosa de Carvalho

Paulo Tadeu Leite Arantes